sexta-feira, agosto 25, 2006

Na hora mais quente do dia
quando a tarde começa vazia
amansam-se carros, a gente fia
pelas ruas da cidade inacabada

Aqui, quando pássaro canta amiúde
vento morno celebra céu sem nuvens
mulheres aliviam mormaço com perfumes
enquanto os homens suam as virilhas

Nesta hora, feito refratária vasilha
encontrei-me dormente na calçada
minha voz descansava nas ondas iônicas
a que apontavam antenas parabólicas

Súbito alarido do sol ecoa
em vez de assustar, atordoa
a velha fábrica da vida campainha
e ao crepúsculo a tarde inteira caminha

No cansaço do meio dia
o repouso da madorna
quando a tarde alta canta
a terra ao trabalho retorna.




quinta-feira, agosto 17, 2006

Passa o sal pela cebola
não chora, arde
acolhe tua lágrima
adoça tua lástima
desacidifica-a

Asia é mal de quem não gosta.

A casca sufoca quem não sente
É livre a semente
de quem posta sua ânsia
no anil da inspiração
e a decifra

Amor á irmão da paciência.

terça-feira, agosto 15, 2006

Id


Sou de um tipo humano
que aceita suas predestinações
e caça, com astúcia, a beleza
da vida que se instala no tempo
antes de minha vontade dizer sim
eu sou a minha língua e algo além.

Sou daqueles cheios de coragem
embora por vezes sinta arder
o trabalho de ásperas sensações
como se elas corroessem meu brio
e tornassem fria a alma. Agora,
de dores estou vazio, o que é bom.


Percebo vir a reconfortante alegria
de achar sobre minha barriga
uma espécie de semente, a qual,
ainda dormente, me promete mais
cada vez mais energia,
como uma filha querida, benvinda.

Por essas e outras, eu agradeço
deus, também transformo em versos
a fruta da minha própria existência.
Extraio desta particular experiência
pedra, água e terra e construo,
na areia, um oasis de mim mesmo.

terça-feira, agosto 08, 2006

A cara que as pessoas têm em seus quartos

(pseudo roteiro de filme-arte curto, escrito em 2005)


Black


letreiro:

coisa pra inglês ver

masturbação hibérica


off

São caras de nomes que eu não sei falar

não me lembro


abre deserto de lagoa vermelha clara

isolados cérebros intocados


off

desertos de caras que eu não sei o nome

não sei falar não me lembro


lagoas de cores perdidas


três por quarto

telefone em punho


a voz calada exprime-se surda


à margem da lagoa vermelha clara

ela esmurra a cabeça de alguém


ela deserta n'outro quarto qualquer


off

hoje eu sinto mórbida saudade

de sensações fora do rádio


ela canta

i love you

my computer


i miss you

my harison ford


quarta-feira, agosto 02, 2006

Na vida, há duas possibilidades
de se aprender a ser feliz:
pela hora da morte,
ou pela flor da idade

Uma tece a sorte
a outra a sanidade,
o gesto lento
a flor inteira
da maturidade.

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