segunda-feira, janeiro 09, 2006

Eu, a cadela Lisboa e seus seis filhotes _ esboço

Eu hoje tomei os filhotes de Lisboa, repeti o gesto primordial que deu origem ao contrato entre humanos e caninos. Dei-lhes de comer, ração n'água morna. Acariciei-os, um a um. Corrompi-os, e dei o mesmo insumo a eles e à mãe, que comeu, obstinada e apressada, sua porção de comida e parte da que dediquei aos seus filhos. Depois passou a andar em círculos em torno de mim, sentado no beiral da porta. Transtornada, ameaçou vômito umas três vezes.

Sabia eu que ela vomitaria e uivaria, ou ainda me arrancaria um braço para dar aos seus. Todavia, ela me ouviu quando eu disse: eu tenho que fazer isso. Prostrou-se à minha direita, perfilada. Mostrou-me suas tetas cheias e, ao contrário do que imaginei, ainda intactas das dentadas dos cãezinhos e cãezinhas que eu via vorazes, sobre os potes com ração amolecida. Porém ela me mostrava que suas tetas davam leite, e eu lhe perguntei: e sua fadiga? Quanto mais eu deveria esperar? Até que você gritasse por estar mordida por seus filhos?

Ademais, ela não teria espaço maior para fugir deles e a noite é longa. É difícil conciliá-los a ela e a mim, juntos. Não sou pai de Lisboa e tampouco pai dos filhotes. Sou intruso na educação canina.

Depois de um instante de pesar, cabeça baixa sobre sua cama, os filhotes já dormiam, ela voltou até mim, quando eu lhe confessei ser cruel.

Ela não vomitou e os filhotes se aquetaram, lesados... Lisboa cada dia se desumaniza mais.

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